ADELE DE OLIVEIRA – FEMINISTA QUASE INÉDITA
Por Gumercindo Saraiva
Interessados na complementação de biografias de seus ilustres voltamos várias vezes à Ceará-Mirim, o mais se distanciavam de nós, os informantes, nada sabendo sobre os assuntos palpitantes, isto, com relação aos poetas do vale, esquecidos, e alguns, residindo no Rio, São Paulo e rio Grande do Sul. Contudo, atingimos o alvo de nossos desejos, conseguindo um “punhado” de poemas da poetisa da terra, que fora nossa professora – Adele de Oliveira – nome consagrado do movimento feminista no Rio Grande do Norte, quando em 1028 iniciava-se em natal os primeiros passos, com a presença da escritora e socióloga Berta Luztz.
MODESTIA DA POETISA PREJUDICOU SUA VIDA
Em 1928, Adele de Oliveira estava com seus 45 anos, pois, há dúvida quanto a época do seu nascimento. Ezequiel Wanderlei, (1872-1933) em “Poetas do Rio Grande do Norte” (1922) registra a data de 1855, ano em que nasceu a poetisa, mas, é sabido que houve um equívoco e por isso Rômulo Wanderley, em “Panorama da Poesia Norte-Rio-Grandense”, 1967, biografando a poeta não menciona a data. E, de uma simplicidade fora do comum, podemos afirmar que Adele de Oliveira, vivia escondida para a cultura potiguar. Não publicava seus poemas, não dava entrevistas, trocava de assunto, quando alguém perguntava-lhe acerca de correspondência mantida na juventude, com intelectuais paraenses onde seu nome era muito conhecido. Da cultura norte-rio-grandense, salientava, o nome de alguns poetas de sua terra, dando lugar de destaque a Juvenal Antunes com quem mantinha uma amizade partida da infância. Mas, na intimidade, não aceitava o humor na poesia do amigo, abusando, como todos sabem, da riqueza possuída em sua cultura poética.
Duvido que tenha havido no Rio Grande do Norte outro poeta do timbre de Juvenal Antunes, escrevendo prosa e verso, com uma linguagem cristalina, pura sem mancha. Como é sabido, somente com o movimento modernista de 1922, houve uma ligação entre a poesia e o humor, cuja separação e rompimento, vieram com o advento do romantismo, parnasianismo e o simbolismo, proibindo terminantemente resquícios de ironia na estrutura de seus estilos. Adele de Oliveira vivendo intelectualmente na fase do Modernismo, jamais aceitou sua doutrina, como diziam, nascido para acabar com o academicismo, e, com poderes para a criatividade brasileira.
O ineditismo na vida intelectual de Adele de Oliveira é um fato que deveria ser estudado separadamente, visto que há muita versão e mesmo depois de muitas entrevistas com a poetisa, jamais ela revelou aquela simplicidade até irritante. E, como dissemos-lhe certa vez, na residência do Dr. José Tavares, jamais compreendíamos sua vida enclausurada, isto é, afastando-se voluntariamente do grupo de intelectuais de sua época, oportunidade em que sempre era visitada por Otoniel Menezes, João Estevão Gomes da Silva, Dr. Abner de Britto , Marcos Falcão, Nascimento Fernandes e tantos admiradores que visitavam a terra de Edgar Barbosa e Nilo Pereira.
No início da década de trinta, residindo de vez em natal, quando viajávamos a Ceará-Mirim, sempre procurava nossa professora, a fim de ser obsequiado com seus poemas, e ela, dando um “não”. Mas, o “não” da poetisa era pronunciado com meiguice, carinho e afago, não sabendo ela que, após sua morte, fomos premiados com uma coleção de versos da melhor qualidade, oferta espontânea do Dr. Ciro Tavares, aumentando, assim, material pertencente ao seu livro “Retalhos de Sonhos”, que ainda havemos de publicar para melhor ser conhecida na nova geração.
Às pessoas mais íntimas, Adele de Oliveira, revelava que seu maior desejo era ver seu livro editado, fato que não aconteceu em vida. Caso isso não fosse realizado, ordenou aos familiares que “tocassem fogo em tudo que escrevera”. Hoje, possuímos seus versos, mas, gostaríamos de conseguir um “Diário” que se encontra em poder de uma amiga, em cujo documentário encontramos reminiscências valiosa para o complemento de sua biografia.
O primeiro poema, Adele de Oliveira compôs aos quinze anos de idade, quando falecia seu pai, viajando de Belém para natal. Vejamos parte desse primor que a poetisa intitulou:
Eu contemplava o mar soluçando e bravio.
As ondas majestosas, vinha se espraiavam.
Em rugidos de dor que nunca se acabavam.
Na linha do horizonte o céu se unia ás águas
E tudo tinha um tom de tristeza e de mágoas.
Chamei-o em vão! Em vão beijei-lhe a face fria.
Sempre o mesmo silêncio e a mesma agonia.
Que martírio meu Deus! Que horror! Que desconforto!
Cruel desilusão!Meu pai jazia morto.
O enamorado, não resistindo à tentação dos amigos que o esperavam no pátio da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, teria dito – e Adele – começa o soneto:
- Eu vou embora, antes que chova. E ela, que de perto dele sempre estar queria, o espaço olhou com perplexão singela, nem uma nuvem pelo espaço havia.
Seguindo Adele de Oliveira, o seu amigo morreu, solteiro, no ano de 1941, em Manaus, sem poder publicar seu último livro: “Cartas a Laura...”